O pesadelo da Globo só piora


Desde que se consolidou como principal emissora de TV do Brasil, a Rede Globo nunca teve que se preocupar para valer com um concorrente. O SBT já quis, durante um tempo, superar a rival. Mas o próprio Silvio Santos, frontman da empresa, já disse que “é impossível” lutar contra os Marinho. Mais recentemente, foi a vez da Record querer fazer frente à gigante. Durante um breve período, até obteve conquistas e bateu a programação global no Ibope em alguns horários. Mas hoje não consegue mais superar nem mesmo o SBT, que voltou a se firmar como segunda maior em audiência.
A hegemonia da Globo se construiu com a mistura de ingredientes que nenhum outro concorrente conseguiu aglutinar de uma só vez: relações políticas poderosas, excelência técnica e capital. E quando se trata de um grupo de comunicação, poder só gera mais poder.
A legislação brasileira brasileira deu uma forcinha. Numa frente, nosso sistema de distribuição de concessões de rádio e TV sempre deu aos políticos a prerrogativa de escolherem quem podia e quem não podia atuar no setor. Em outra, a Constituição não permite a entrada de players estrangeiros em negócios de comunicação no país com uma participação maior que 30%.
Mas eis que o cenário começa a mudar e o horizonte, para a Globo, é turvo como nunca antes.

O cenário

O momento não poderia ser pior. A audiência da TV em geral vem ladeira abaixo há alguns anos. O brasileiro já passa mais tempo na internet do que vendo televisão, como mostrou a Pesquisa de Mídia Brasileira de 2015. Com a popularização da TV a cabo, as emissoras abertas já sentiram um primeiro baque. Agora, com o surgimento de serviços de streaming baratíssimos – como Netflix e Looke – a coisa ficou ainda mais complicada.
Para piorar, projetos de lei em tramitação no Congresso, se aprovados, acabarão de vez com a vida fácil que a companhia dos Marinho teve até aqui. As iniciativas tratam desde a mudança no modelo de concessões (toda emissora de TV aberta, para utilizar o espectro de transmissão, precisa de uma autorização estatal, que em média dura 15 anos e, via de regra, é sempre renovada) até a mudança da Constituição para permitir que empresas estrangeiras possam atuar no mercado nacional sem limite de participação no capital social.

O pesadelo

Todo esse cenário nebuloso ficou pior com o aparecimento de um concorrente disposto a encarar a briga com a gigante, a Turner, companhia americana que controla diversos canais com atuação global, como CNN, Cartoon Network e TNT. No Brasil, a companhia adquiriu o Esporte Interativo, que era um discreto canal de esportes alternativos e o transformou em um gigante, que hoje peita a Globo na disputa pelos direitos de transmissão do futebol, conforme já tratamos aqui.
Nesta semana, uma notícia colocou o mercado em alerta: a Band, que ao longo dos últimos 10 anos manteve um acordo amigável com a Globo para transmitir o Campeonato Brasileiro em parceria com a concorrente, anunciou que não manteria a aliança e deixaria de exibir os jogos. Nesta sexta, começaram a circular especulações que devem estar preocupando os Marinho: a Turner adquiriu 30% da emissora da família Saad.
Segundo as notícias que estão sendo veiculadas, a empresa americana vai assumir totalmente a parte de entretenimento da emissora, deixando aos atuais donos da Band apenas o controle do jornalismo.
Se a entrada da companhia no negócio brasileiro se confirmar, a Turner potencializará fortemente seu poder de fogo na briga contra a Globo pelos direitos de transmissão do futebol, já que vai conseguir se igualar à concorrente na oferta: canais na TV paga e na aberta.
Segundo O Lance, Turner e Globo começaram essa guerra em dezembro do ano passado, quando o Esporte Interativo ofereceu um total de R$ 550 milhões aos 20 clubes da série A pelos direitos de transmissão do Brasileirão em TV fechada. Com isso a Globo teve que aumentar de R$ 900 milhões para R$ 1,1 bilhão sua oferta pelo pacote que engloba TV aberta (Globo), TV fechada (Sportv) e internet (Globo.com). Mesmo assim, o valor referente à TV fechada ficou em apenas R$ 100 milhões.
Embora o valor oferecido pela Globo para a TV paga seja bem inferior ao proposto pelo Esporte Interativo, a companhia teve força para manter a maior parte dos clubes sob suas asas até agora por causa do bolo maior, que envolve TV aberta e internet. Com a entrada da Turner na TV aberta, o cenário pode mudar completamente.
Façam suas apostas, pois essa história está longe de acabar.
Por Simão Mairins

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